Autor: Lucas de Melo Oliveira – Presidente da Frente Cearense de Geração Distribuída, Membro da Coalizão Movimento Solar Livre, e CEO da Sunplena Investimentos em Energia.
Conteúdo baseado no Radar Uinvex, material escrito pessoalmente pelos fundadores da Uinvex ou por experts renomados em suas áreas de atuação sobre temas relevantes do mercado de investimentos.
Sumário Executivo
A MP 1304/2025 preserva a atratividade econômica da Geração Distribuída no varejo (residencial/comercial/serviços/indústria) ao manter o sistema de compensação de energia como política pública financiada e ao priorizar transparência tarifária na transição para o ACL (Mercado Livre de Energia). Embora imponha tetos e mecanismos de ajuste na CDE, o cenário-base continua favorável para a expansão de portfólios de GD em telhados e pequenos terrenos, com reforço de teses “ativos reais + renda recorrente”. Um dos pontos principais de comemoração da MP 1304 foi a preservação do direito adquirido no Marco Regulatório da GD, através da Lei 14.300/2022, mantendo as regras para instalações prévias a MP 1304, tanto GD1 como GD2 e GD3.
Tese central: para investidores com apetite por fluxos de caixa previsíveis, a GD permanece um veículo eficiente de geração de renda indexada à inflação de energia, com baixa correlação a ativos financeiros tradicionais e forte demanda estrutural por redução de conta de luz.
Antes de falarmos sobre os principais pontos relacionados a MP 1304, é válido trazer a projeção de crescimento da GD para os próximos anos, e ao final, farei uma conclusão sobre o assunto.
1.1 Projeções para Geração Distribuída em 2025
O mercado de GD, predominantemente solar fotovoltaica, deve continuar sua expansão robusta em 2025:
- Crescimento percentual: A Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABGD) projeta um crescimento de cerca de 25% para o setor em 2025, enquanto ONS, CCEE e EPE preveem um aumento de 29% na geração de energia em mini e micro usinas.
- Capacidade instalada: A Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) estima que o Brasil deve adicionar 13,2 GW de potência solar em 2025 (somando geração distribuída e centralizada), com cerca de 43 GW provenientes especificamente da GD até o final do ano.
- Investimentos: A expansão do setor deve atrair cerca de R$ 39,4 bilhões em investimentos ao longo de 2025.
- Crescimento real: O crescimento da capacidade instalada de GD já superou 5 GW no primeiro semestre de 2025, indicando que as projeções anuais são realistas.
1.2 Projeções para Geração Distribuída em 2026
As informações sobre 2026 são mais preliminares e indicam uma tendência de crescimento, embora possivelmente em ritmo mais moderado em comparação com 2025:
- As projeções gerais do Plano Decenal de Expansão de Energia 2034 (PDE 2034) do MME/EPE indicam que a GD poderá atingir 70,5 GW de potência acumulada até 2034, o que implica um crescimento contínuo nos anos seguintes a 2025.
- Embora a expansão continue, há menções a uma potencial desaceleração no crescimento da GD em relatórios de meados de 2025, o que sugere um ritmo mais conservador para 2026.
2. MP 1304 e suas implicações
2.1 O que muda (e o que permanece) para a GD
- Sistema de Compensação mantido como política pública custeada: preserva o racional econômico da GD varejo, previsto na lei 14.300/2022. Logo, se preservou a segurança jurídica estabelecida e acordada entre os participantes do pleito (governo, concessionárias, produtores de energia).
- Abertura do ACL (mercado livre) para Baixa Tensão, faseada em duas etapas: 24 meses para consumidores comerciais/industriais e 36 meses para consumidores residenciais. Isso aumenta a comparabilidade entre tarifas e pode impulsionar a GD como hedge para quem não migrar ou como complementar a quem migrar.
- Criação do Supridor de Última Instância, que será uma espécie de FGC (Fundo Garantidor de Créditos) do mercado de energia, garantindo que o contrato e o fornecimento do cliente permaneçam ativos em caso de falência ou inadimplência da comercializadora.
- Teto do CDE (Conta de Desenvolvimento Energético) e criação do ECR (Encargo Complementar de Recursos): disciplina o crescimento de subsídios/encargos. Exige gestão ativa de risco regulatório, mas não altera a espinha dorsal da GD varejo no horizonte imediato. Caso o teto do CDE seja ultrapassado em 2026, o ECR realizará o aporte complementar necessário para o reequilíbrio da conta, sendo cobrado 50% do seu valor em 2027, e 100% do seu valor em 2028.
- Autoprodução/equiparação: novos limites afetam grandes arranjos; GD varejo (Lei 14.300) segue seu curso com foco em prosumidores (empresas ou indivíduos que são tanto consumidores como produtores de energia) e telhados, principalmente a microgeração.
2.2 BESS e isenções (armazenamento)
- Diretrizes para regulação pela ANEEL de acesso, remuneração e múltiplos serviços (flexibilidade, potência, serviços ancilares).
- Renúncia fiscal com teto anual (vigência 2026–2030) e autorização para redução a zero do Imposto de Importação sobre BESS e componentes, conforme regulamentação federal. Sistemas fotovoltáicos habilitados no benefício devem prever armazenamento químico.
- Implicação: melhora de bancabilidade e criação de casos de uso rentáveis (stand-alone ou acoplado a GD/geração central).
Com isso, é importante ressaltar que está havendo uma redução acentuada do preço da tecnologia BESS no mundo, trazendo mais oportunidades de negócio para os próximos anos.
2.3 Busca de solução para curtailment (eólica/solar)
- Reconhecimento normativo do corte de geração com ressarcimento via ESS e retroatividade a 01/09/2023; ONS apura, CCEE compensa; agente renuncia a ações judiciais equivalentes para receber.
- Implicação: melhora do perfil de risco/receita, relevante em regiões com restrição sistêmica; avanço para financiabilidade dos projetos.
2.4 Autoprodução / equiparação
- Manutenção de direitos adquiridos; para novos arranjos, exigências mínimas: demanda agregada ≥ 30 MW (e ≥ 3 MW por unidade) e participação societária compatível com direito a voto/controle.
- Implicação: reduz espaço para estruturas pulverizadas por pequenos investidores; GD varejo e ACL via varejista ganham atratividade relativa.
2.5 Pontos controversos — térmicas a carvão e gás
- Carvão: manutenção/contratação até 2040 e cláusulas de consumo mínimo. Críticas: lock-in fóssil, pressão tarifária e retrocesso climático.
- Rateio sistêmico: custos de reserva/exposição involuntária repartidos entre consumidores (ACR/ACL), elevando custo médio.
- Gás: facilitação do gás da União; pode deslocar renováveis em janelas específicas de preço.
3. Vantagens de continuar investindo na Geração Distribuída
3.1 Renda recorrente e defensiva: contratos de locação com consumidores finais ou condomínios de energia criam previsibilidade de caixa.
3.2 Hedge natural contra energia cara: a economia do cliente cresce com a conta de luz, preservando o “valor entregue” do ativo.
3.3 Capilaridade de demanda: crescimento expressivo do varejo amplo (residências, comércio, serviços, PMEs), com um número elevado de novas unidades consumidoras entrantes (+ de 1,8 milhões de novas unidades ao ano);
3.4 Escalabilidade modular com rentabilidade atrativa acima da média: CAPEX por ativo pequeno (média de R$250.000,00 a R$300.000,00 por usina), clustering por carteira (risco diluído por cliente) e rentabilidade entre 19% e 24% em média;
3.5 Valorização por eficiência operacional: O&M, monitoramento, redução de perdas e gestão de portfólio elevam margem.
3.6 Sinergia com BESS BTM (behind-the-meter): suaviza picos, melhora autoconsumo, viabiliza produtos premium para comércio e indústria, sendo um mercado bem atrativo inclusive no modelo de leasing.
3.7 ESG tangível: redução de emissões com impacto local (comunicação e marketing de produto “energia que rende”).
4. Riscos e mitigadores
4.1 Risco CDE/encargos: monitorar atos infralegais; mitigar com margens prudentes, contratos com gatilhos de reajuste e diversificação regional.
4.2 Tarifas segregadas/ACL: produtos ACL-BT podem competir com a GD; mitigação via bundle (GD + contrato varejista) e foco em segmentos com baixo apetite ao risco de preço.
4.3 Crédito do consumidor final: diversificação de carteira, garantias simples, cobrança digital.
4.4 Execução/engenharia: padrões técnicos, seguros adequados, gestão pós-venda.
5. Modelos vencedores para 2025–2029
5.1Telhado varejo premium: pacotes “chave na mão” com financiamento próprio + manutenção + garantia estendida.
5.2 Condomínios de energia solar (remoto): ideal para investidores que buscam escala com tíquete médio baixo e segurança do ativo.
5.3 Comércio e Indústria com BESS: GD + storage para clientes com demanda/encargos relevantes, para suprir diferentes demandas como Economia no Hora Ponta, Redução de Demanda, provocando diminuição do Payback do investimento.
5.4 Parcerias setoriais: redes de varejo, clínicas, academias, escolas – carteira com risco setorial distribuído.
Conclusão
A MP 1304/2025 mantém o case da GD firme e com boa assimetria risco-retorno. O investidor que combinar originação qualificada, disciplina de execução e hedges contratuais continuará capturando renda previsível e proteção contra a alta estrutural da energia.
Os dispositivos adicionais da MP 1304/2025 reforçam uma narrativa clara para investidores: mesmo diante de controvérsias associadas ao prolongamento de térmicas fósseis e da disciplina dos incentivos setoriais, a transição energética brasileira segue impulsionada por eficiência, digitalização e integração de tecnologias. A GD, combinada a armazenamento (BESS) e à maior previsibilidade regulatória para curtailment, emerge como um eixo estratégico capaz de entregar segurança energética local, redução de custos ao consumidor e retornos ajustados ao risco superiores aos modelos tradicionais.
Para quem investe em ativos reais, o posicionamento correto é capturar o movimento estrutural de descentralização e eletrificação — onde tecnologias limpas, gestão inteligente da energia e soluções de autoconsumo constituem o novo padrão de competitividade e proteção patrimonial no setor elétrico brasileiro.
Observação: este documento será atualizado conforme regulamentações complementares.
Lucas de Melo Oliveira